TEATRO SEMINÁRIO (21/05/2012) – ARTAUD, Antonin - O teatro e seu duplo. Martins Fontes. São Paulo, 1999.
Grupo 07 - Ana Paula Malavazi dos Santos – 5163738
Jean Gustavo Oliveira de Morais – 5935047
Leandro Fagundes Coelho – 6471251
Rafael D’Amico Flaborea – 6518961
Ricardo Pena Edwards – 5422789
Roberta Marcondes Costa – 5129378
Thais de Almeida Bessa – 6471077
Em o “Teatro e seu Duplo”, Antonin Artaud visa instaurar uma nova linguagem para o teatro, reformulando o já existente e edificando uma nova proposta. A obra é uma revolução na forma de conceber essa manifestação artística. O teatro deve ser uma linguagem que rompa com todas as limitações e que represente a vida como uma eterna magia, constituindo uma arte de elementos vivos. Na obra expõe-se o grito, a respiração e o corpo do homem, como lugar primordial do ato teatral e denuncia-se o teatro digestivo bem como rejeita a supremacia da palavra. Para o autor o teatro é o lugar privilegiado de uma germinação de formas que refazem o ato criador, formas capazes de dirigir ou derivar forças. Deveria ser considerado como um “Duplo”, não da realidade cotidiana e direta da qual foi reduzido a ser uma cópia inerte, mas de uma realidade perigosa e arquetípica. Para tornar-se essencial, o teatro deve dar tudo o que pode ser encontrado no amor, no crime, na guerra ou na loucura.
Partindo da obra elaboramos uma cena em que os participantes, em silêncio, escreviam na lousa “corredor de carinho”. Após isso e sem mencionar nada, o grupo vai puxando os espectadores pela mão, um a um, e os posicionando um de frente para o outro, de forma que se desenhe um corredor com os corpos. Quando o corredor humano está pronto, o grupo começa a passar no meio e induz, através de gesto e imitação, todos os espectadores (agora agentes ativos da cena) a fazer carinho, seja através do toque nos braços, ou de cafuné de afagos nos ombros, entre outros. Todos passam pelo corredor na medida em que quando o indivíduo que está passando chega ao fim, ele vira uma das “paredes” e começa a acariciar os próximos que virão. E quem está na entrada do corredor humano, entra nele e vai passando para receber carinho. Carinho este que por vezes pode ser incômodo, uma vez que o toque de pessoas desconhecidas por vezes gera estranheza. O corredor humano remete a um animal comprido que passa por um ritual autofágico, onde rabo (fim do corredor) vira cabeça, e cabeça vira rabo (início do corredor), de forma contínua e infinita. Um corpo desprovido de órgãos. Nesta cena, apenas um participante do grupo permanece alheio à passagem que todos estão envolvidos. Este se mantém fora do corredor, em pé, parado e com a cabeça baixa, e quando todos já estão confortáveis e habituados com a dinâmica, ele começa a proferir: “ – No Piauí a cada 100 crianças que nascem, 38 morrem antes dos 8 anos de idade. Antes dos 8 anos de idade. Antes dos 8 anos de idade. Antes dos 8 anos de idade. Antes do 8 anos de idade. Antes dos 8 anos de idade. Antes dos 8 anos de idade...”. O personagem segue dizendo de forma repetitiva e contínua a frase “Antes dos 8 anos de idade” e os demais participantes do grupo também começam a dizê-la, de um modo em que em poucos minutos forma-se um coro que soa a frase como uma espécie de mantra. Após algum tempo nessa dinâmica, aonde todos estão entregues à cena, o grupo inesperadamente cai, de forma estática, estirado no chão e assim encerra-se a cena. O grupo com esta cena dialoga com a obra de Antonin Artaud, uma vez que tenta explorar ao máximo a transcendência dos corpos através do aprofundamento dos sentidos: tato, audição e visão. O toque, embora vise o acolhimento, gera uma série de sentimentos nos envolvidos da cena, levando-os a uma profusão de sensações que os tira do papel de mero espectadores do ato. Eles saem do lugar comum e viram personagens de cena, buscando a aproximação que Artaud almejava em o “Teatro da Crueldade”, onde não havia nenhuma distância entre ator e plateia, todos seriam atores e todos fariam parte do processo ao mesmo tempo. A intenção é provocar algo a mais. Além da sensação de acolhimento, o corredor também atormentava. Seja pelo tato, seja pela palavra. A repetição desenfreada da frase “antes dos 8 anos de idade” gera um desconforto tanto pelo caráter repetitivo quanto pelo aprisionamento. Um universo repetitivo gera um sensação claustrofóbica. Esse sentido é aflorado pelo contexto dos dizeres. Trata-se da idade em que crianças morrem no Piauí. Uma morte que é associada à miséria, à condições subumanas, à fome. Fome esta que é citada por Artaud em seu prefácio. “Antes de retornar à cultura, constato que o mundo tem fome e que não se preocupa com a cultura; e que é de um modo artificial que se pretende dirigir para a cultura pensamentos voltados apenas para a fome. O mais urgente não me parece tanto defender uma cultura cuja existência nunca salvou qualquer ser humano de ter fome e da preocupação de viver melhor, mas extrair, daquilo que se chama cultura, ideias cuja força viva é idêntica à da fome.” (ARTAUD, pag.1) A fome é anterior a cultura. As necessidades vitais, as sensações, são anteriores ao que é construído socialmente. Sendo assim, é necessário buscar de elementos vitais, a manifestação artística teatral.
Na cena pretende-se a elevação da consciência de dentro para fora, desejando-se mais vida na arte, mais profundidade e carga de sentido através do contato-improvisação. Há uma explosão interior. Artaud critica o positivismo e o discurso racional ocidental que permeia a arte. O grupo desgarra-se desse racionalismo, contrapondo ações e palavras, gestos e dizeres. Na arte não se encontra respostas plausíveis, simetria, linearidade, prontidão, formalidade.
Artaud imagina o teatro como uma revelação, uma exteriorização da crueldade presente num indivíduo. Dessa maneira ele compara a revelação que se dá, através do teatro, com a peste no sentido de ver explodindo em cena todas as forças profundas e ocultas que estão em potência no interior do ator. “Como a peste, o teatro é, portanto, uma formidável convocação de forças que conduz o espírito, pelo exemplo, à origem de seus conflitos” (ARTAUD, pag. 42). O teatro, assim como a peste, leva o homem a se ver exatamente como ele é, sem máscara, exteriorizando todos os sentimentos por piores que sejam: “O teatro, como a peste, é feito à imagem dessa carnificina, dessa essencial separação. Desenrola conflitos, libera forças, aciona possibilidades, e se essas possibilidades e essas forças são regras, a culpa não é da peste ou do teatro, mas da vida” (ARTAUD, pag. 44). Embora o teatro seja a peste, não morre. A arte liberta e garante a imortalidade.
Em síntese, Artaud teoriza que “é necessário acreditar em um sentido da vida renovado pelo teatro, onde o homem impavidamente torna-se mestre daquilo que ainda não existe, e o faz nascer. E tudo aquilo que não nasceu ainda pode nascer, desde que não nos contentemos em continuar sendo simples órgãos registradores”. (ARTAUD, pag.22).
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